Crédito, Andre Borges/EPA/ShutterstockLegenda da foto, Lula citou ‘políticos brasileiros’ que apoiaram tarifaço como ‘traidores da pátria’Article InformationAuthor, Rute Pina e Mariana AlvimRole, Da BBC News Brasil em São Paulo17 julho 2025Atualizado Há 27 minutosEm meio à escalada de tensões entre Brasil e Estados Unidos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez um pronunciamento na noite desta quinta-feira (17/7) classificando as tarifas impostas aos produtos brasileiros como uma “chantagem inaceitável”.De acordo com Lula, nos últimos meses o governo brasileiro vem tentando negociar com os EUA sobre as tarifas, por meio de reuniões e uma proposta de acordo.”Esperávamos uma resposta, e o que veio foi uma chantagem inaceitável, em forma de ameaças às instituições brasileiras, e com informações falsas sobre o comércio entre o Brasil e os Estados Unidos”, afirmou no pronunciamento.Lula também chamou de “traidores da pátria” políticos brasileiros que demonstraram apoio à medida — uma crítica implícita a atores da direita como o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro que está morando nos EUA e vem pressionando políticos americanos por retaliações ao Judiciário brasileiro.”Minha indignação é ainda maior por saber que esse ataque ao Brasil tem o apoio de alguns políticos brasileiros. São verdadeiros traidores da pátria. Apostam no quanto pior, melhor. Não se importam com a economia do país e os danos causados ao nosso povo”, acrescentou o presidente.Ele também defendeu o Pix, que classificou como “patrimônio” do povo e “um dos sistemas de pagamento mais avançados do mundo”.O Pix não foi diretamente mencionado pela Casa Branca, mas o governo americano criticou práticas favorecendo “serviço de pagamento eletrônico desenvolvido pelo governo”.No pronunciamento, Lula defendeu a soberania e o Judiciário do Brasil, afirmando que o país respeita “o devido processo legal, os princípios da presunção da inocência, do contraditório e da ampla defesa”.O presidente brasileiro também rebateu, caracterizando como alegações “falsas”, o argumento de Trump de que o Brasil estaria impondo “déficits comerciais insustentáveis contra os Estados Unidos” e que estaria praticando comércio desleal.”Os Estados Unidos acumulam, há mais de 15 anos, robusto superávit comercial de US$ 410 bilhões de dólares”, declarou Lula.O petista enfatizou ainda que plataformas digitais estrangeiras atuando no Brasil são “obrigadas a cumprir as regras” do país. Ao anunciar tarifas de 50% contra o Brasil, Trump argumentou que decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) puniram plataformas de mídia social americanas com multas e com a saída do mercado de mídia social brasileiro.Como já havia declarado anteriormente, Lula afirmou que, em resposta às tarifas recém-anunciadas, o Brasil vai buscar a Organização Mundial do Comércio (OMC) e pode eventualmente aplicar a Lei de Reciprocidade contra os EUA.Lula fala à CNN: ‘Quando vi a carta, achei que fosse fake news’Mais cedo, em entrevista à jornalista Christiane Amanpour, da CNN, Lula disse que Donald Trump “não foi eleito para ser imperador do mundo”.À emissora americana, Lula afirmou que, se Trump fosse brasileiro, “ele também seria julgado” por sua participação nos eventos do Capitólio e, caso tivesse violado a Constituição, “também estaria preso”. “Quando vi a carta [com o anúncio das tarifas, postada por Trump em rede social], eu achei que fosse fake news”, disse Lula. “Para mim foi uma surpresa não só o valor da tarifa, mas como foi anunciado. Ele [Trump] está quebrando todo e qualquer protocolo, toda e qualquer liturgia que deve existir no relacionamento entre dois chefes de Estado.”Lula também disse à CNN que não quer ser “refém dos Estados Unidos” e destacou que o Brasil está disposto a negociar, mas não vai aceitar imposições. “O Brasil gosta de negociar em paz. É assim que eu ajo, e acho que é assim que todos os presidentes deveriam agir. E penso o mesmo sobre o presidente Trump, que o Brasil é um aliado histórico dos EUA. O Brasil valoriza as relações econômicas que tem com os EUA, mas o Brasil não aceitará nada imposto a ele de outro país. Aceitamos negociação, e não imposição”, disse.Crédito, Reprodução/X/@amanpourLegenda da foto, Lula deu a primeira entrevista à TV americana desde que Trump anunciou tarifaçoLula também afirmou que não lida com Trump como um “político de extrema direita”, mas como um chefe de Estado. “Eu não sou um presidente progressista, eu sou o presidente do Brasil. Eu não vejo o Trump como presidente de direita, eu vejo como presidente dos Estados Unidos. Ele foi eleito. Tem o respaldo do povo americano. Então, a melhor coisa é sentar numa mesa para conversar. Até agora, ele tem demonstrado que não tem interesse, porque acha que pode fazer as tarifas que quiser.”O brasileiro disse que não há intenção de romper laços com os EUA. “Ninguém quer romper com os Estados Unidos, ninguém quer prescindir dos Estados Unidos. O que queremos é não ser refém dos Estados Unidos”, afirmou Lula.Ele pontuou que o Brasil já vem diversificando seus parceiros comerciais e defendeu o fortalecimento do Brics e a maior liberdade nas transações entre os países do bloco.”Representamos 40% do comércio internacional e 25% do PIB mundial. O Brics não foi criado para brigar com o Norte, mas para discutir de forma pacífica e igualitária os seus problemas”, colocou o petista.Casa Branca reage à entrevista na CNNCrédito, REUTERS/Nathan HowardLegenda da foto, Porta-voz da Casa Branca disse que Trump ‘é o líder do mundo livre’As declarações de Lula à CNN provocaram uma reação imediata do governo americano.Horas depois da entrevista ir ao ar, a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, rebateu as críticas do presidente brasileiro. A jornalistas, ela disse que Trump não quer ser o “imperador do mundo”, como disse Lula, mas que é um líder forte com influência global. “O presidente certamente não está tentando ser o imperador do mundo. Ele é um presidente forte dos Estados Unidos da América e também é o líder do mundo livre”, disse Leavitt.”Vimos uma grande mudança em todo o globo por causa da liderança firme deste presidente.”Leavitt também criticou o Brasil por práticas ambientais e pela proteção à propriedade intelectual, afirmando que “as regulações digitais do Brasil e a fraca proteção à propriedade intelectual prejudicam empresas americanas” e colocam os produtores e agricultores dos EUA em desvantagem competitiva.As acusações nessas áreas ecoam pontos destacados pela investigação comercial anunciada contra o Brasil.Questionada sobre a carta de Trump anunciando tarifas de 50% sobre produtos brasileiros, ela afirmou que as medidas visam proteger os interesses do povo americano.Tributação das big techsTambém nesta quinta, durante discurso na abertura do 60º Congresso da UNE (Conune), em Goiânia, Lula afirmou que o Brasil passará a cobrar impostos das empresas de tecnologia dos Estados Unidos. Sem detalhar como a medida será aplicada, ele disse que “o Brasil vai julgar e vai cobrar imposto das empresas digitais norte-americanas”.A declaração foi dada dois dias após os EUA iniciarem a investigação comercial contra o Brasil. A porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, disse que a ação busca entender se medidas do governo Lula estão prejudicando as big techs (empresas de tecnologia e redes sociais) dos EUA.O objetivo da investigação é analisar se políticas brasileiras na área de comércio seriam “irracionais ou discriminatórias” e se “oneram ou restringem o comércio dos EUA”, segundo um comunicado do Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR, na sigla em inglês), agência do governo federal.No evento da UNE, Lula também voltou a defender o multilateralismo e criticou a postura do presidente norte-americano nas negociações internacionais. “Eu tenho certeza que o presidente norte-americano jamais negociou 10% do que eu já negociei na minha vida. Então, se tem uma coisa que eu sei na vida, é negociar”, exaltou Lula.
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