Por João Arruda | Cáceres
Um dos ícones da culinária mato-grossense, o Restaurante Kaskata Flutuante, conhecido por suas especialidades em peixes e sua quase quatro décadas de história, acaba de ancorar em um novo endereço. Deixando para trás a tradicional Baía de Cáceres, o flutuante agora se estabelece na margem esquerda do Rio Paraguai, na Praça Vila Boas, no coração da cidade. A mudança, realizada há poucos dias, marca o início de um novo capítulo para o estabelecimento e para a paisagem ribeirinha de Cáceres.
A realocação do Kaskata, após décadas operando em seu ponto original, é um reflexo direto das obras de revitalização da “Orla de Cáceres”, que estão em pleno andamento. A execução dos serviços tornou imperativo que os proprietários de embarcações transferissem seus pontos de atracação, liberando a Baía e fixando-se no leito do Rio Paraguai. Vale ressaltar que a saída dessas embarcações da Baía era uma antiga reivindicação da comunidade, especialmente de ambientalistas, que viam a necessidade de desobstrução da área.
O Kaskata Flutuante é uma verdadeira referência na gastronomia regional, com um cardápio que celebra os peixes frescos da região. Sua reputação transcende as fronteiras estaduais, tendo sido destacado por revistas especializadas em turismo e viagens, como a renomada 4 Rodas, como um dos melhores restaurantes do país. Entre os pratos que mais encantam a refinada clientela, destacam-se o saboroso Pintado Grelhado no Espeto e o autêntico Pacu à Bororo, além de uma variedade de outras iguarias da requisitada culinária mato-grossense.
À frente do empreendimento estão Wagna Pereira e João Marinho Natal, carinhosamente conhecido como “Preto”. O casal administra o legado herdado dos pais, Faustino Natal e Helizabeth Quen Garcia Marinho Natal, que foram pioneiros na ousada ideia de estabelecer um restaurante flutuante em Cáceres. João Marinho assegura que a mudança de endereço não alterou a rotina do comércio, que segue prestando atendimento aos clientes com o mesmo padrão de qualidade e excelência que o consagrou. Ele acredita firmemente que a implementação da nova Orla trará um visual mais atrativo ao cartão-postal da “Princesinha do Paraguai”, beneficiando não apenas a população local, mas também os visitantes que buscam a cidade como porta de entrada para o Pantanal.
Garçom Tião: Um Testemunho de Três Décadas e um Encontro Inesquecível
No coração do Kaskata, há uma figura que se tornou parte da história do restaurante: o garçom Sebastião Espinosa, conhecido por todos como Tião. Há cerca de 30 anos, Tião dedica-se ao Kaskata, trabalhando ao lado dos patrões e colegas. Sua cordialidade, educação e profissionalismo lhe renderam inúmeros elogios e até moções de aplausos do parlamento local, um testemunho de seu caráter exemplar.
Garçom Sebastião Espinosa
Em sua longa trajetória de serviços prestados na mesma empresa, Tião acumula memórias e histórias, mas uma em particular marcou profundamente sua vida. Ele relembra que, em setembro de 1999, um grupo de quatro clientes desceu a escadaria do flutuante, atraindo olhares curiosos. Eram os advogados Everaldo Batista Filgueiras e Rinaldo Cosme Marques Dias, o juiz Leopoldino Marques do Amaral e o jornalista João Arruda.
Naquele momento, para Tião, tudo parecia mais uma etapa rotineira de sua atividade profissional. No entanto, dias antes, o magistrado Leopoldino Amaral havia concedido uma entrevista “bombástica” à jornalista Carmen Célia, da Globo/TVCA, que se tornou matéria de capa no Jornal Nacional. O teor das denúncias de Amaral, que falavam de supostas vendas de sentenças por desembargadores da época, causou uma repercussão avassaladora, espalhando-se como um rastro de pólvora.
Leopoldino estava em Cáceres para obter mais provas junto a advogados locais antes de seguir para Cuiabá. Pouco tempo depois desse encontro, o magistrado foi sequestrado e executado em território paraguaio. “Eu fiquei muito abalado quando soube do ocorrido, pois infelizmente acabei servindo a ele junto aos outros três clientes, talvez sua última refeição”, recorda Tião, que, apesar da dolorosa memória, segue firme em sua rotina de trabalho, mantendo viva a história e a tradição do Kaskata Flutuante. A mudança de endereço traz novos ares, mas as histórias e o sabor da tradição permanecem, enraizados na alma do rio e de seus personagens.
João Arruda é jornalista em Cáceres | Mato Grosso