As empresas e políticos dos EUA que tentam convencer Trump a desistir de tarifas ‘devastadoras’ contra o Brasil



Crédito, Adriano Machado/ReutersLegenda da foto, Os americanos são os maiores compradores de café do Brasil Article InformationAuthor, Marina Rossi e Rute PinaRole, Da BBC News Brasil em São PauloHá 4 horasEm semana decisiva para as negociações em torno das tarifas de importação de 50% sobre produtos do Brasil, políticos, representantes de entidades e empresas de diferentes segmentos brasileiros estão se movendo para tentar evitar o tarifaço.Mas também existem vozes no empresariado e no mundo político americano que estão tentando convencer o presidente americano Donald Trump a reduzir ou desistir das tarifas contra o Brasil, que devem entrar em vigor na sexta-feira (01/08).Desde que Trump anunciou, em 9 de julho, que uma nova sobretaxa de 50% será imposta, ele e o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ainda não conversaram para tentar chegar a um acordo, algo que vem sendo cobrado amplamente.E, nesta quarta (30), o presidente americano postou na sua rede social, Truth Social, que o prazo para a entrada em vigor das tarifas continua a ser 1º de agosto. “O prazo de primeiro de agosto é o prazo de primeiro de agosto- ele permanece forte e não será prorrogado. Um grande dia para a América”, escreveu Trump, sem mencionar o Brasil. O diálogo entre Trump e Lula foi pedido pela U.S. Chamber of Commerce e pela Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil), duas das principais organizações que representam os interesses do setor privado americano.As entidades publicaram uma nota conjunta solicitando que os dois países “se engajem em negociações de alto nível a fim de evitar a implementação da tarifa de 50%”.”Mais de 6,5 mil pequenas empresas nos Estados Unidos dependem de produtos importados do Brasil, enquanto 3,9 mil empresas americanas têm investimentos naquele país”, disseram as entidades em nota.”O Brasil está entre os dez principais mercados para exportações dos Estados Unidos e é destino, a cada ano, de cerca de US$ 60 bilhões em bens e serviços americanos.”Diante do impasse, outros empresários americanos também se mobilizaram. As importadoras de suco de laranja Johanna Foods e Johanna Beverage Company foram ao Tribunal de Comércio Internacional (CIT, na sigla em inglês) dos Estados Unidos pedir alívio emergencial diante da possível alta nos preços com a nova tarifa.No documento, as empresas afirmam que novas taxações poderão forçar um aumento de 20 a 25% no preço final para o consumidor e colocariam em risco 700 empregos.As projeções pessimistas estão surgindo nas mais variadas dimensões. Da imensa indústria do suco de laranja a um pequeno café no Maine, extremo nordeste dos EUA. Ali, a proprietária do Rock City, Jessie Northgraves, publicou nas redes sociais um comunicado aos seus clientes na semana passada com más notícias.”Nossos preços aumentarão na próxima semana e esperamos também compensar a possibilidade iminente de uma tarifa de 50% sobre os grãos de café do Brasil.” No comunicado, Northgraves explica que nos últimos seis meses o preço do café vinha subindo como nunca antes. Mudanças climáticas e aumento no consumo da bebida explicam esse aumento. O café, assim como o suco de laranja, é um dos produtos mais sensíveis ao tarifaço porque os Estados Unidos importam em grande quantidade do Brasil. O país é o maior comprador do produto brasileiro. No ano passado, os EUA receberam 16,4% das exportações de café do Brasil, segundo o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). Diante das taxas já impostas por Trump sobre diversos produtos e na iminência de novas tarifas, o reajuste teve de ser repassado aos consumidores. E as perspectivas não são animadoras.”Na minha opinião, a situação toda parece estar se agravando. Já estamos pagando tarifas de 10% sobre os grãos provenientes de todos os lugares de onde os adquirimos, e parece haver o risco de as tarifas do Brasil aumentarem para 50%, o que seria devastador”, disse Northgraves à BBC News Brasil.No setor de aviação, a SkyWest, companhia aérea dos Estados Unidos que encomendou 74 aviões da Embraer, também criticou o tarifaço.Na semana passada, o CEO da empresa, Chip Childs, afirmou que não pretende pagar a tarifa de 50% sobre jatos encomendados até 2032 com a empresa brasileira, caso a medida entre em vigor.A declaração foi dada durante a apresentação do balanço financeiro do segundo trimestre da empresa.”Temos a sensação de que as pessoas estão entendendo a importância disso para pequenas comunidades nos Estados Unidos, o impacto econômico disso para o nosso país”, disse Childs. “Vamos continuar lutando muito para avançar nessa frente das tarifas.”Na mesma reunião, o diretor comercial da SkyWest, Wade Steele, também admitiu a possibilidade de adiar entregas combinadas com a empresa brasileira. “Se a tarifa de 50% com o Brasil for implementada, planejamos trabalhar com nossos principais parceiros e a Embraer para adiar a entrega até que a situação tarifária seja resolvida”, disse.Em abril, Trump já havia anunciado tarifas de 10% sobre produtos brasileiros. A SkyWest já teve que arcar com essas tarifas, com custos adicionais em dois jatos entregues no segundo trimestre.As exportações para clientes americanos representam 45% nos jatos comerciais e 70% nos jatos executivos da empresa brasileira.Segundo estimativas da própria Embraer, caso a tarifa de Trump se confirme em 50%, a empresa terá um custo adicional de US$ 9 milhões (cerca de R$ 50 milhões) ao preço de cada aeronave para seus clientes.’Abuso de poder’No Congresso americano, também há movimentações em curso. Na quinta-feira passada (24/07), um grupo de 11 senadores democratas enviou uma carta a Trump pedindo o fim do tarifaço comercial contra produtos brasileiros, mencionando “abuso de poder” contra o Brasil. Segundo os parlamentares, a taxação vai aumentar os custos para famílias e empresas americanas.”Os americanos importam mais de 40 bilhões de dólares anualmente do Brasil, incluindo quase 2 bilhões de dólares em café. O comércio entre EUA e Brasil sustenta cerca de 130 mil empregos nos Estados Unidos, que estão ameaçados com a imposição de tarifas elevadas”, diz o grupo na carta.”O Brasil também prometeu retaliar, e o senhor antecipadamente prometeu responder na mesma moeda — o que significa que os exportadores americanos sairão prejudicados e que os impostos sobre importações pagos pelos americanos ultrapassarão os 50% que o senhor ameaçou impor.”Os senadores acrescentaram que tinham “sérias preocupações quanto ao claro abuso de poder presente em sua recente ameaça de iniciar uma guerra comercial com o Brasil”. “Os Estados Unidos e o Brasil têm questões comerciais legítimas que devem ser discutidas e negociadas. No entanto, a ameaça tarifária do seu governo claramente não diz respeito a isso”, escreveram os senadores.Já os deputados que presidem o Congressional Coffee Caucus, uma espécie de comissão no congresso americano para debater temas relacionados ao setor de café, enviaram no fim de junho uma carta com apoio bipartidário ao embaixador do comércio dos EUA, pedindo a isenção do produto das tarifas atuais e futuras.Crédito, Adriano Machado/ReutersLegenda da foto, Os EUA respondem por cerca de 37% das exportações brasileiras de suco de laranjaNa carta, os deputados Jill Tokuda (democrata, Havaí) e William Timmons (republicano, Carolina do Sul) disseram ao representante comercial dos EUA, Jamieson Greer, indicado por Donald Trump, que a isenção é necessária “para proteger os empregos americanos e garantir a vitalidade contínua de uma indústria que depende quase inteiramente de importações”.Eles lembram que, ao contrário de outros produtos afetados pelas novas tarifas, o café nos Estados Unidos não é produzido em escala capaz de suprir a demanda interna. De acordo com o documento, a produção americana de café, cultivado no Havaí e em Porto Rico, não representa nem 1% do consumo da bebida no país.Nesta terça, o secretário de Comércio dos Estados Unidos, Howard Lutnick afirmou à rede CNBC que alguns produtos não cultivados nos EUA poderiam estar isentos das taxações. Dentre eles o café, a manga, o abacaxi e o cacau. Lutnick, no entanto, não mencionou o Brasil. “Se vamos negociar com um país que produz manga ou abacaxi, então eles podem entrar sem tarifa. Café e cacau são outros exemplos de recursos naturais”, completou.Portanto, ainda não é possível saber a dimensão do impacto que a nova tarifa causará no bolso dos consumidores americanos, acostumados a tomar ao menos três xícaras da bebida por dia. Mas ao menos os clientes do Rock City Coffee já estão pagando mais caro pela bebida.”As tarifas prejudicarão nossos negócios, pois não conseguiremos manter nossas margens de lucro sem aumentar os preços – e, se esses preços subirem o suficiente, poderemos perder clientes para empresas maiores e mais capazes de absorver custos e manter os preços baixos”, afirmou Northgraves. ‘Tarifa proibitiva’O National Foreign Trade Council (Conselho Nacional de Comércio Exterior) já considera a tarifa de 10% imposta pelo governo Trump após 2 de abril uma mudança muito significativa na capacidade das empresas americanas de importarem do Brasil.Agora, a tarifa de 50% prevista para entrar em vigor em 1º de agosto pode inviabilizar negócios com o parceiro comercial. É o que afirma Tiffany Smith, vice-presidente de Comércio da entidade, que representa grandes empresas em temas de comércio e investimento internacional.”O Brasil tem mantido superávit comercial com os Estados Unidos. E uma tarifa de 50% coloca o país entre os que enfrentam as taxas mais altas no atual ambiente de tarifas recíprocas. É algo que consideramos bastante preocupante”, disse à BBC News Brasil.”Uma tarifa nesse nível seria proibitiva para a maioria dos produtos. A expectativa é que as importações do Brasil parem, em muitos casos, enquanto essa tarifa estiver em vigor. Pode haver alguns produtos que suportem uma tarifa tão alta, mas não seriam muitos.”Segundo ela, empresas americanas podem tentar minimizar os impactos transferindo a produção para outros países. Mas essa alternativa nem sempre é viável, principalmente a curto prazo.”Por conta de contratos em vigor ou exigências técnicas, como peças automotivas que precisam atender a padrões específicos de segurança. Essas adaptações não ocorrem rapidamente”, afirma Smith.”Nesses casos, as empresas teriam que repassar os custos para os consumidores ou absorver perdas significativas em suas margens de lucro.”Smith avalia que a política tarifária reflete uma “convicção forte do presidente” de que os parceiros comerciais precisam abrir mais seus mercados para empresas americanas.”No caso do Brasil, a ideia é que, mesmo com superávit, poderia haver espaço para ampliar as exportações dos EUA. Mas a linguagem da carta sugere que considerações políticas também podem ter influenciado a decisão.”Ela ressalta que a tarifa de 50% pode ser apenas o início de uma mudança mais ampla na relação comercial entre os dois países. “O resultado desse processo, que deve levar alguns meses, pode resultar na imposição de novas tarifas ou outras medidas, além da tarifa já anunciada.”Crédito, Assessoria da Comissão Temporária Brasil-EUALegenda da foto, Parte da comitiva de senadores brasileiros nos EUA nesta terça, da direita para a esquerda: Fernando Farias (MDB-AL), Jaques Wagner (PT-BA), Esperidião Amin (PP-SC) e Astronauta Marcos Pontes (PL-SP)Nesta segunda-feira (28/07), uma missão especial do Senado esteve na Câmara Americana do Comércio, em Washington, para uma reunião com lideranças empresariais e representantes do Conselho Empresarial Brasil-Estados Unidos.Após a reunião, o senador Carlos Viana (Podemos-MG) afirmou que uma conversa entre Trump e Lula está sobre a mesa. “Nós estamos dialogando neste momento”, afirmou o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), no fim da tarde de segunda-feira (28/7) em entrevista coletiva. Ao ser perguntado se havia falado com Lula sobre a possibilidade de uma conversa entre ele e Trump, afirmou que ainda não. “Mas o presidente Lula é o homem do diálogo. Sempre defendeu o diálogo”, disse.



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