Bolsonaro: Moraes ameaça ex-presidente de prisão se entrevistas dele forem publicadas em redes sociais



Crédito, Getty ImagesArticle InformationAuthor, João Fellet, Thais Carrança e Rute PinaRole, Da BBC News Brasil em São PauloHá 5 minutosO ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nesta segunda-feira (21/7) que as restrições impostas a Jair Bolsonaro (PL) na última sexta-feira incluem a veiculação de áudios, vídeos e entrevistas do ex-presidente por redes sociais de terceiros.Em despacho no qual detalha a decisão de sexta, Moraes afirmou que as restrições a Bolsonaro abarcam “transmissões, retransmissões ou veiculação de áudios, vídeos ou transcrições de entrevistas em qualquer das plataformas das redes sociais de terceiros, não podendo o investigado [Bolsonaro] se valer desses meios para burlar a medida, sob pena de imediata revogação e decretação da prisão”.A BBC News Brasil questionou o STF se Bolsonaro está proibido de dar entrevistas. Através da assessoria de imprensa, a Suprema Corte informou que não há proibição de dar entrevistas mas que, se essas entrevistas forem reproduzidas nas redes sociais pelos órgãos de imprensa — ou postadas ou reproduzidas nas redes por qualquer pessoa — isso fere as medidas cautelares e Bolsonaro pode ir preso.A BBC questionou o STF se isso não configura na prática uma proibição de dar entrevistas, mas o órgão informou que não prestaria esclarecimentos adicionais e que vale o que está no despacho de Moraes.Na sexta-feira (18/7), Moraes determinou uma série de medidas cautelares contra Bolsonaro.Pela decisão do ministro, além de não poder usar suas redes sociais, Bolsonaro deve cumprir recolhimento domiciliar entre 19h e 6h de segunda a sexta-feira e em tempo integral nos fins de semana e feriados.O ex-presidente também passou a monitorado por tornozeleira eletrônica; não pode manter contato com embaixadores, autoridades estrangeiras e nem se aproximar de sedes de embaixadas e consulados. As medidas foram pedidas pela Polícia Federal (PF), com parecer favorável da Procuradoria-Geral da República (PGR).Ao justificar o pedido, a Polícia Federal afirmou que Bolsonaro e o filho dele — e deputado licenciado — Eduardo Bolsonaro (PL-SP) “vêm atuando, ao longo dos últimos meses, junto a autoridades governamentais dos Estados Unidos da América, com o intuito de obter a imposição de sanções contra agentes públicos do Estado Brasileiro”.As iniciativas, segundo a PF, estariam associadas a uma suposta perseguição que Bolsonaro diz sofrer no processo criminal que enfrenta no Supremo, acusado de liderar uma tentativa de golpe de Estado.Ao analisar o caso, Moraes considerou que há indícios de que Jair Bolsonaro e Eduardo teriam praticado atos ilícitos que podem configurar os crimes de:coação no curso do processo;obstrução de investigação de infração penal que envolva organização criminosa;e atentado à soberania nacional.Segundo o ministro, as precauções tomadas seriam necessárias para evitar uma possível fuga de Bolsonaro e assegurar a aplicação da lei penal. Em nota publicada no X em inglês, Eduardo Bolsonaro criticou a decisão de Moraes.”Desta vez, não se trata apenas de censura ou de medidas coercitivas contra o líder político mais proeminente do Brasil — um homem que jamais se recusou a cumprir decisões judiciais ou a participar de processos legais. O que torna essa decisão ainda mais absurda é o fato de se basear em ações tomadas pelo governo dos Estados Unidos, após o anúncio de tarifas contra o Brasil feito pelo presidente Donald Trump — como se isso, de alguma forma, configurasse um crime.”Eduardo disse ainda que, para ele, Moraes está tentando criminalizar o presidente Trump e o governo americano.”Como não tem poder contra eles, escolheu fazer do meu pai um refém. E, ao fazer isso, não ataca apenas a democracia brasileira — ele prejudica, de forma irresponsável, a relação do Brasil com seu mais importante aliado. Isso é sabotagem institucional, pura e simples.”Em nota oficial, os advogados do ex-presidente afirmaram:”A defesa do ex-Presidente Jair Bolsonaro recebeu com surpresa e indignação a imposição de medidas cautelares severas contra ele, que até o presente momento sempre cumpriu com todas as determinações do Poder Judiciário. A defesa irá se manifestar oportunamente, após conhecer a decisão judicial.”Confira os indícios apontados por Alexandre de Moraes nas ações de Bolsonaro e Eduardo que configurariam cada um desses crimes, listados na íntegra do processo disponibilizada pelo STF.Crédito, ReutersLegenda da foto, Bolsonaro passou a utilizar tornozeleira eletrônicaCoação no curso do processoA decisão de Alexandre de Moraes enxerga “indícios suficientes e razoáveis” do crime previsto no artigo 344 do Código Penal, que criminaliza a tentativa de influenciar o resultado de um processo por meio de violência ou grave ameaça.O magistrado cita o alinhamento de Bolsonaro com seu filho, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro, para intimidar autoridades com a busca de sanções do governo dos Estados Unidos contra integrantes do STF, PGR e da PF que atuam na investigação e julgamento da tentativa de golpe de Estado em 2022.Moares cita publicações em redes sociais e entrevistas que incluem ameaças de punições pelos EUA, como a cassação de visto, bloqueio de bens e proibição de relações comerciai. Segundo ele, essas manifestações visam intimidar os agentes públicos, sob a alegação de perseguição política.As publicações se dão, sobretudo, em postagens em redes sociais, que reverberam em outros canais de mídia, bem como em entrevistas diretas a veículos de imprensa, diz o magistrado, que inseriu um print de entrevista de Eduardo na CNN em que o deputado diz esperar sanções ao Brasil.”Há um manifesto tom intimidatório para os que atuam como agentes públicos, de investigação e de acusação, bem como para os julgadores na Ação Penal, percebendo-se o propósito de providência imprópria contra o que o sr. Eduardo Bolsonaro parece crer ser uma provável condenação.”O objetivo, diz Moraes, é “embaraçar o andamento do julgamento técnico” da investigação da tentativa de golpe de Estado e perturbar os trabalhos do inquérito das fake news, que apura a disseminação de notícias falsas, ameaças, calúnias e outros crimes contra a corte e seus membros.Crédito, Reprodução/XLegenda da foto, Postagem de Eduardo Bolsonaro no X falando sobre sanções contra Moraes e projeto de lei do Congresso dos EUA que pode tirar visto de Moraes, citada na decisão de Alexandre de MoraesObstrução de investigaçãoEm sua argumentação, Moraes também cita a obstrução de investigação de infração penal que envolva organização criminosa, crime previsto na Lei 12.850/13.Segundo o ministro, Bolsonaro e Eduardo têm buscado criar entraves econômicos nas relações comerciais entre os Estados Unidos e o Brasil para “obstar o prosseguimento da AP 2668”, que apura a tentativa de golpe de Estado após as eleições presidenciais de 2022.Moraes cita o Pix de R$ 2 milhões que Bolsonaro confessou ter enviado a Eduardo, no dia 13 de maio. O auxílio financeiro ocorreu quando Eduardo já estava no exterior, “em plena ação das atividades ilícitas” relacionadas à busca de sanções e pressões sobre o Brasil.A “vultosa contribuição financeira” encaminhada a Eduardo é, segundo o magistrado, forte indício do alinhamento do réu com o seu filho, “com o claro objetivo de interferir na atividade judiciária e na função jurisdicional” do STF e “abalar a economia do país”.Crédito, Getty ImagesAtentado à soberania nacionalO artigo 359-I do Código Penal criminaliza “a negociação com governo estrangeiro para que este pratique atos hostis contra o país”.Segundo Moraes, Bolsonaro, com seu filho Eduardo, está “atuando dolosa e conscientemente de forma ilícita” para tentar submeter o funcionamento do STF “ao crivo de outro Estado estrangeiro”, com graves impactos à soberania nacional e com objetivo de “gerar instabilidade política e econômica” no Brasil.Moraes afirma que, em publicação no Instagram, Bolsonaro demonstrou ter interferência no tarifaço anunciado pelo governo Trump contra produtos brasileiros.O ex-presidente e seu filho também comemoraram a “gravíssima agressão estrangeira ao Brasil”, diz Moraes, manifestando-se favoravelmente às sanções e taxações.Moraes também cita a reunião de Bolsonaro com Ricardo Pita, conselheiro sênior do Departamento de Estado dos Estados Unidos para o Hemisfério Ocidental, em maio. Após a reunião, o ex-presidente declarou nas redes sociais que “o alerta foi dado, e não há mais espaço para omissões”, e complementou com pedido “aos Poderes que ajam com urgência apresentando medidas para resgatar a normalidade institucional”.Já Eduardo agradeceu expressamente Trump pela carta em que anuncia o tarifaço, pleiteando a aplicação da Lei Magnitsky – lei americana que prevê a possibilidade de sanções contra autoridades estrangeiras.”A ousadia criminosa parece não ter limites, com as diversas postagens em redes sociais e declarações na imprensa atentatórias à Soberania Nacional e à independência do Poder Judiciário”, disse o magistrado.Em aparente resposta, no dia 18 de julho, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, anunciou na rede social X ter ordenado a revogação do visto de Moraes para entrar nos Estados Unidos.De acordo com postagem de Rubio nesta sexta-feira (18/07), além do visto de Moraes, ele solicitou a revogação da permissão para os familiares do ministro e seus “aliados” — sem detalhar quem são esses.



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