Dois séculos após o imperador Dom Pedro I decretar a criação de um jardim botânico na capital mato-grossense, Cuiabá revive o antigo sonho. A programação comemorativa aos 200 anos da carta imperial, datada de 24 de setembro de 1825, trouxe à tona a importância e a urgência de concretizar o projeto de um Jardim Botânico no Morro da Luz, a área inicialmente indicada pelo próprio imperador.
O tema “A Importância dos Jardins Botânicos para as Cidades” foi o cerne da palestra ministrada nesta quarta-feira (24) pelo Dr. Claudio Nicoletti de Fraga, pesquisador do Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. O evento, organizado pela Prefeitura de Cuiabá, por meio da Secretaria Municipal de Planejamento e Desenvolvimento Urbano, reuniu cerca de 80 pessoas no auditório da Energisa, no bairro Bandeirantes, com o objetivo de “provocar” para que o sonho bicentenário se torne realidade.
A carta original de Dom Pedro I, que se encontra no Arquivo Público do Estado de Mato Grosso, foi apresentada e lida pelo secretário José Afonso Portocarrero, marcando a celebração da data e reforçando a relevância histórica da iniciativa. A discussão enfatizou a importância da botânica, da preservação da memória científica e, especialmente, do legado de Antônio Luiz Patrício da Silva Manso, que há dois séculos projetou Cuiabá no cenário científico internacional.
“É um prazer estar aqui em Cuiabá, uma cidade com uma história riquíssima na botânica. Um dos pioneiros nesse campo foi Antônio Luiz Patrício da Silva Manso, que viveu aqui e teve papel fundamental no envio de plantas para compor a Flora Brasiliensis, obra de grande relevância científica. Graças a ele, Cuiabá entrou no mapa do conhecimento botânico do Brasil há cerca de 200 anos”, afirmou o Dr. Claudio Nicoletti de Fraga. O pesquisador lamentou que essa memória tenha se perdido, mas expressou otimismo com o esforço atual de resgate.
Dr. Claudio, que coordena dois eixos no Jardim Botânico do Rio de Janeiro – o Sistema Nacional de Registro de Jardins Botânicos e o apoio à criação de novos espaços – ressaltou sua alegria em ver “nascer a possibilidade de mais um jardim dedicado à conservação da flora brasileira”.
O secretário municipal de Planejamento Urbano, José Afonso Portocarrero, destacou que o crescimento acelerado de Cuiabá gerou uma “ressaca” na cidade, e que o Jardim Botânico pode “recuperar a alma da cidade”. “É uma proposta que se inicia no Morro da Luz, mas que envolve também o centro histórico, parte essencial de tudo isso. É uma oportunidade que temos de resgatar uma ideia de 200 anos atrás, vinda ainda do imperador Dom Pedro I”, pontuou Portocarrero. Ele também reafirmou seu compromisso em construir alianças com a sociedade e o setor econômico para concretizar o projeto, revelando que a oportunidade de dar andamento a essa iniciativa foi um dos motivos para seu retorno à prefeitura após 30 anos.
A primeira-dama e vereadora Samantha Iris reforçou que um Jardim Botânico vai além da pesquisa e conservação, sendo um espaço vital para a educação. “Um lugar onde nossas crianças poderão aprender, desde cedo, a importância de cuidar da natureza e se orgulhar da riqueza da nossa terra. Que possamos, juntos — poder público, comunidade científica, sociedade civil e setor produtivo —, construir as alianças necessárias para que esse projeto avance”, disse ela, visualizando o Jardim Botânico do Morro da Luz como “um legado de esperança, de cuidado e de amor pela nossa cidade”.
O secretário da Defesa Civil de Cuiabá, coronel Alessandro Borges, elogiou a iniciativa da Prefeitura em resgatar a história do Morro da Luz. “A proposta inicial era criar um espaço para cultivar e preservar nossas plantas nativas, e agora vemos esse projeto ser retomado com um olhar de perenidade. Esse espaço poderá preservar espécies em risco de extinção e, ao mesmo tempo, aproximar nossas crianças da história da flora cuiabana”, afirmou, conectando o projeto à rica tradição da Santa Casa de Misericórdia, também com quase 200 anos.
Durante a palestra, Dr. Claudio Nicoletti explicou que um Jardim Botânico é uma área protegida e organizada, onde se cultivam e colecionam plantas, com espécies cientificamente identificadas e documentadas. “É a capacidade de criar e conservar o que já não pode ser mantido em seu habitat natural. O jardim é artificial, mas rico em informações. E permite cultivar coisas que vocês nem imaginam”, detalhou, acrescentando que o resgate de memórias e histórias é também um papel fundamental desses espaços.
Estiveram presentes no evento, reforçando a importância do diálogo e da parceria, os secretários municipais Lise Bokorni (Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano), Hélida Vilela de Oliveira (Assistência Social, Direitos Humanos e Inclusão), e o adjunto Amarildo Batista (Relações Comunitárias); a vereadora Dra. Mara; a superintendente do IPHAN em Mato Grosso, Ana Joaquina da Cruz Oliveira; o presidente do CDL Cuiabá, Aurelino Levy; a professora Doriane Azevedo (UFMT); e representantes da Sema e da Energisa, que cedeu o auditório para o evento.
Com a afirmação do Dr. Claudio Nicoletti de que Cuiabá possui “ouro em pó nas mãos”, referindo-se ao potencial de seu Jardim Botânico, a expectativa é que o projeto, que atravessou séculos de espera, finalmente floresça, entregando à cidade um espaço vital para a conservação, educação e a valorização de sua história e biodiversidade.