Crédito, Acervo Centrorochas/Karina Porto-FirmeLegenda da foto, EUA são principal mercado das rochas ornamentais brasileirasArticle InformationUm deles é o de rochas ornamentais, que enviou para os EUA mais da metade (56,3%) de tudo o que vendeu para o exterior em 2024 (US$ 1,26 bilhão). Desse total, cerca de 82% saíram do Espírito Santo, conforme os dados da Associação Brasileira de Rochas Naturais (Centrorochas).Algumas já chegaram inclusive a fazer demissões. É o caso da Lime Stone, localizada em Cachoeiro de Itapemirim (ES), que dias atrás cortou 31 dos 57 funcionários, mais da metade.”Uma tarifa de 50% simplesmente inviabiliza nosso negócio”, diz Bruno Sfalsin, um dos gestores da companhia.Ele e a família operam pedreiras na região e fundaram a Lime Stone em 2024 porque viram uma oportunidade de crescer vendendo blocos de rochas ornamentais para o mercado americano.Mesmo sem saber o que vai acontecer na data prevista para o início do tarifaço, o empresário preferiu se antecipar e reestruturar o negócio, voltando a focar no mercado interno e analisando a possibilidade de atender outras regiões do mundo como Europa e Oceania.”É uma situação muito triste, a gente não fica feliz com isso”, diz Sfalsin, acrescentando que, “caso venha alguma coisa diferente” e o comércio entre Brasil e EUA seja normalizado, poderia recontratar os funcionários desligados. “Na época da covid foi a mesma coisa”, ele ilustra.Crédito, ReproduçãoLegenda da foto, Trecho da carta enviada pela prefeitura de Cachoeiro a Trump: menção aos filhos ilustres Roberto Carlos e Rubem BragaMais da metade da produção de rochas ornamentais de Cachoeiro de Itapemirim é exportada para os EUA, conforme os dados compartilhados com a reportagem pela prefeitura do município.A cidade tem acompanhado com apreensão as tentativas de interlocução do governo brasileiro com o americano em busca de negociar a derrubada das tarifas ou um acordo para reduzir o valor da alíquota de 50%, a mais alta imposta pela gestão Trump na última rodada de anúncio de tarifas.O prefeito Theodorico Ferraço (PP) chegou a escrever uma carta para o presidente americano em 15 de julho pedindo que reconsiderasse a decisão.”A imposição de uma tarifa desta magnitude teria consequências econômicas devastadoras e imediatas para nossa cidade”, diz o texto.À BBC News Brasil, Ferraço afirmou que quase 700 empresas se dedicam no município à extração e beneficiamento de mármore e granito, empregando cerca de 9.500 pessoas, o que corresponde a aproximadamente 20% da população ocupada na cidade.Uma eventual disrupção na cadeia produtiva, segundo ele, poderia comprometer até 30% da arrecadação do município.”Se não puder tirar o tarifaço de tudo, que tire pelo menos do nosso mármore e granito. A esperança e o desespero estão muito grandes no meio empresarial, e isso automaticamente se transmite para os empregados”, declarou o prefeito.Crédito, Acervo Centrorochas/Karina Porto-FirmeLegenda da foto, Espírito Santo responde por mais de 80% das exportações de rochas ornamentasNesta terça (29/7), o secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick, chegou a dizer que produtos selecionados poderiam ser isentos das novas tarifas, especialmente aqueles que os EUA não produzem internamente. Ele mencionou café e manga, mas sem citar diretamente o Brasil.Ferraço diz que a carta endereçada a Trump, que cita o cantor Roberto Carlos e o escritor Rubem Braga, ambos naturais de Cachoeiro, foi enviada por e-mail diretamente para o gabinete do presidente americano, mas que até o momento não houve retorno.O prefeito, que é pai do vice-governador do Espírito Santo, Ricardo Ferraço (MDB), ressaltou ainda que o impacto no Estado vai além do setor de rochas ornamentais, podendo atingir indústrias como a do ferro e aço e a culturas como a do café e do mamão, que também costumam ser exportadas para os EUA.”Quem está mais prejudicado com essa questão do tarifaço é o Ceará [que exporta uma grande quantidade de pescados]. O segundo lugar é o Espírito Santo”, completa.Crédito, Acervo Centrorochas/Cajugram Blue-RomaLegenda da foto, Rochas brasileiras são usadas principalmente em bancadas de cozinha americanas’Dependemos 110% dos EUA’Com uma cadeia produtiva bastante voltada para o consumidor americano, o setor de rochas ornamentais do Espírito Santo tem uma série de empresas que trabalham quase exclusivamente voltadas para o mercado externo.É o caso, por exemplo, da Brothers in Granite, que tem inclusive um galpão de distribuição em Houston, no Estado do Texas, de onde envia seus produtos para todo o território dos EUA.A empresa compra blocos de pedra natural — granito, quartzito, mármore — de pedreiras ao redor do Brasil, corta e faz o polimento e acabamento dos produtos em um parque industrial em Serra (ES) para depois exportar as chapas.”Nós dependemos 110% dos EUA”, diz Daniel Salume, um dos fundadores da empresa, ao falar da importância do mercado americano.Ele e o irmão, Fernando, montaram a Brothers in Granite em 2007, quando deixaram a empresa de exportação em que trabalhavam para investir no próprio negócio, que tem crescido de forma orgânica desde então.A companhia tem hoje cerca 7 funcionários nos EUA e 30 no Brasil, muitos dos quais em férias coletivas no momento. A interrupção já estava em parte programada para a realização da troca de maquinário, e veio a calhar neste momento de incerteza.A empresa embarca por mês entre 12 e 15 contêineres para os EUA. Dos que foram enviados no início de julho, ainda antes do anúncio do tarifaço, alguns ainda estão nos navios a caminho dos portos americanos.A depender do trajeto e do tempo de parada em outros portos, o transporte de rochas pode levar de três semanas a algo entre seis e oito semanas para atingir o destino final.”E ninguém sabe exatamente qual é a data que conta para realmente receber a taxação de 50%, se é a da saída do último porto do Brasil, a do primeiro porto ou a da chegada aos EUA. Até agora isso não está claro para a gente”, comenta Salume.O estoque no centro de distribuição em Houston é suficiente para três meses.Caso o cenário de implementação das tarifas se concretize, Salume diz que estuda reposicionar o negócio para talvez importar rochas ornamentais de outros países e distribuir a partir da base que está montada em solo americano.”Existem algumas saídas nas quais a gente pode pensar. Nenhuma delas clara ainda, porque estamos no meio da tempestade”, ele pontua. “Entretanto, por não sermos uma empresa de grande porte, conseguimos ser mais versáteis”, completa, otimista.Crédito, Acervo Centrorochas/Stone PalaceLegenda da foto, Cerca de 1,2 mil contêineres de rochas deixaram de ser embarcados em julhoO vice-presidente da Centrorochas, Fábio Cruz, ressalta que, para empresas de médio e grande porte, é difícil pensar em alternativas neste momento.”As que têm um coeficiente de exportação muito elevado não conseguem simplesmente escolher não mais exportar a partir de agora”, comenta. “Você tem toda uma produção voltada para isso. E os prejuízos já estão acontecendo.”Representantes da entidade embarcam nesta quarta-feira (30/7) para Washington, onde participarão de um encontro na embaixada do Brasil como parte da mobilização internacional contra a tarifa.A associação está em contato com pelo menos duas entidades representativas dos EUA que também têm se articulado para interceder junto ao governo americano pelas exportações brasileiras.São eles a Natural Stone Institute (NSI), que representa a indústria de rochas, e a National Association of Home Builders (NAHB), que reúne incorporadores, empreiteiros e empresas da cadeia da construção civil.Um dos objetivos, segundo Cruz, é negociar uma extensão de 90 dias do prazo previsto para início da vigência da medida.”Eu gostaria muito de acreditar que isso ainda é possível”, ele afirma, emendando que nesse período o setor poderia negociar uma “tarifa que seja equivalente à dos outros países que competem com o Brasil”.”Pra que o Brasil consiga pelo menos continuar no jogo”, completa.
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